Quisera, um dia, ter veloz e escorreito débito de palavras capazes de exprimir pensamentos meus imunes à sua comunicação, indiferentes ao receptor e suas minudências interpretativas. Missão impossível esta, pois se nem os sinais gráficos destinados a pontuar a escrita estão isentos dos cataclismos da ab-rogação hodierna. Por muito que ensaiemos a fiel manutenção das cartilhas escolares apreendidas e daquilo que entendemos fazer parte integrante daquilo que somos - porque somos aquilo que aprendemos e nada mais - existe sempre uma voz por quem os sinos dobram, que nos ecoa no subconsciente depois de tomado o conhecimento dessas modernas abjecções desenhadas em propostas de lei escritas sem o uso do maléfico sinal, e que tarde ou cedo em lei se converterão. Segundo consta pelos papiros cibernautas e não só, enredos informativos à disposição de quem a tiver, o uso do ponto de exclamação no final de uma frase exclamativa denuncia o histerismo do escritor, ou melhor, daquele que junta letra após letra. Pasme-se. Melhor: Pasme-se! Li algures que esta sinalefa - “!” – se assemelha a qualquer coisa como um foguetório onde a exclamação é a intensidade dos pobres de espírito, como se as pessoas achassem que só são veementes quando desatam aos gritos e que a intensidade de uma frase não devia depender de instrumentos tão desajeitados . Ora, valham-me todos os deuses da escrita, presididos por Toth! Que conste, para que me não chamem histérica, que o ponto de exclamação que acabo de usar pretende tão só exprimir ironia, cumprindo, assim, a sua função. Sendo a pontuação um recurso que permite expressar, pelo uso de um conjunto sistematizado de sinais gráficos, na língua escrita, um conjunto de matizes rítmicas e melódicas características da língua falada, permitam-me que me interrogue: por que carga de águas haverei de me abster de os usar apenas porque um qualquer iluminado que, graças ao demolidor efeito do contágio por osmose do não-é-de-bom-tom, multiplica-se em inúmeros iluminados até se tornar lei, entendem que é de-mau-tom o uso do dito ponto de exclamação que tem tanto poder como o final, o de interrogação ou, ainda, da vírgula? Ainda bem que não é definitivo e irreversível o extermínio a que têm estado sujeitas as pessoas de bom senso e nem toda a gente embarca nestes festivais. Li, no seguimento da primeira leitura sobre a tal abjecção ao ponto de exclamação, esta frase interrogativa, com o devido ponto de interrogação no seu fim: Qual é a fórmula matemática do bom senso ? Pois bem, gostaria, também eu, de obter resposta a esta questão. Será que ainda podemos ter esperança na sua descoberta? Será assim tão problemático e de difícil trato o simples entendimento de que, a haver eventual dolo na interpretação das palavras inseridas ou não em frases devidamente ou não pontuadas, a culpa é da única e exclusiva responsabilidade do leitor. A existirem medos e pudores geradores de embaraços não deveriam estes deixar de ser apelidados de linguísticos para passarem a ser próprios, pessoais e intransmissíveis?
Quisera, um dia, ter veloz e escorreito débito de palavras capazes de exprimir pensamentos meus imunes à sua comunicação, indiferentes ao receptor e suas minudências interpretativas -Missão Impossível!
Quisera, um dia, ter veloz e escorreito débito de palavras capazes de exprimir pensamentos meus imunes à sua comunicação, indiferentes ao receptor e suas minudências interpretativas -Missão Impossível!
10 comentários:
Caramba!!! Isto é que é falar... quer dizer, escrever!
Eu pessoalmente da mesma opinião... Com reticências e tudo...
Eu pessoalmente da mesma opinião... Com reticências e tudo...
Mas haverá alguém que possa impedir quem quer que seja de pontuar como lhe der na veneta?!
A "cena", como diria o "privada", é levantar-se a cada opção que tomamos, um coro de protestos.
É o eterno hábito de me querem obrigar a ser feliz. Escuteiros?! Dispenso.
Não confundir opinião com imposição.
Acho que o Saramago pontua mal como a merda. E quê? Não posso achar?
Outros acham que pontua muito bem e de forma original. Parabéns e bom proveito.
O garante da continuidade da espécie deve-se à percentagem moderada de cretinos que a integra.
Paradoxos divinos.
Há uns anos vi um graffiti em Aveiro que dizia: "Ver televisão, amolece o cérebro"
Os comentários que precedem o meu primeiro, confirmam e tese.
O garante da continuidade da espécie deve-se à percentagem moderada de cretinos que a integra.
Cum caraças, meu!!! Ganda máxima!!! Que ninguém se atreva a impingir-me outra!!! Adesivei totauuu, cara!!!
P.s - Para que não se cansem a contá-los - são 12 os pontinhos :-) Bem regressado, jg!!! (E vão + 3)
Concordo com o jg por isso só vejo novelas.
Cérebro amolecido, soninho garantido.
Cuidei que iria escrever sobre o ponto "i".
Deixarei esta para comentário posterior... Que há coisas que me fazem urticária.
Uma delas é o "artista" que faz arte que não serve a mais ninguém (na minha terra, chama-se a isto outra coisa) mas este artigo tem muitíssimo mais.
Caraças para o tempo que me falta!
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