quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

A CLASSE CEPHALOPODA

Esta “coisa” que se tem passado nos últimos dias com a comunicação social faz-me lembrar as notícias sobre a violência doméstica. Dizem os números que, de há um par de anos para cá, aumentou drasticamente. Ora, todos sabemos que, afinal, o que aumentou foi o registo das denúncias. O mesmo se passa com todo este alarido que se tem feito em volta das alegadas pressões para total controlo da liberdade de expressão ou, para que ninguém se encha de pruridos fazendo a devida destrinça, da comunicação.

Confesso que qualquer tipo de folclore me causa fortes crises de urticária, embora reconheça a necessidade e o valor da representação e registo cultural de todos os povos. Estas vozes que agora se fazem, copiosamente, ouvir, com repetidos sons agudos e lancinantes aos ouvidos dos que os têm já tão cheios de pungentes estridências desgovernadas, prenhas de uma gravidez psicológica predestinada a parir ventos de tudo menos de mudança, provocam-me surdez profunda e severa.

Desde quando a liberdade de expressão e/ou comunicação é sinónimo de divulgação da verdade? Quem, na posse das suas plenas faculdades cognitivas, pode afirmar-se bem informado, aquando da pluralidade de informação. É do mais primário engano que se trata. Quanto maior é a informação, menor é o conhecimento. Somos hiroshimamente bombardeados com verdades de uns fundamentadas nas mentiras de outros e nagasakimamente canhoneados com mentiras de outros alicerçadas nas verdades de uns.

O que me intriga não é a onda de indignação que por aí se fecunda como coelhos, consequência da proclamada isenta liberdade de investigação, sabe-se lá por que insondados meios e com que éticos procedimentos da, até à data, dita livre comunicação social. O que me intriga é tão-somente a capacidade que o povo tem de se deixar arrastar para as correntes que a mesma faz fluir. Ninguém se questiona sobre os reais motivos de uns e outros. É letra de lei o que se escreve e ninguém quer ler para além do que se lê. Eles são aos molhos os desditosos arrasados, erradicados das suas próprias casas ou crónicas, devido aos caprichos de um tirano chefe, cujo entendimento editorial não se cruza com o caminho da publicação de textos cujo conteúdo sofre da ausência do princípio do contraditório. E vai daí, demitem-se de beiça feita, da casa que é sua por direito de usucapião em vez de ficarem e continuar a usar da argamassa, e depois dizem-se os coitadinhos despejados do seu próprio tecto. E choram-se rios de tinta, mares de angústias antecipadas, roubadas ao futuro como quem rouba o apocalipse que há-de vir.

Entretanto, como quem não quer a coisa e até que outro iluminado e atento representante da tão apregoada liberdade de expressão e/ou comunicação se lembre de borrifar todas as páginas da sagrada Comunicação Social com mais uma informação livre e isenta e, por isso, verdadeira, ninguém se debruça sobre o facto de um qualquer administrador de empresa pública precisar de renunciar, dizem eles que eu não faço a mínima sobre os meandros em que se verifica tal renúncia, ao cargo de administrador executivo da mesma empresa, para poder preparar a sua defesa sem quaisquer constrangimentos e para que a sua presença nos órgãos sociais da PT não pudesse servir para lesar a imagem e a reputação do grupo e nunca, obviamente, por ter sido protagonista de conduta menos adequada aos requisitos do cargo que ocupa. De somenos importância terá saber quais as contrapartidas financeiras auferidas, ou a auferir por tal administrador com a sua saída da empresa pública e a falta de comentários dos seus chefes hierárquicos com a descabida afirmação de que a empresa nunca comentou ou transmitiu fora da sede própria – que é a divulgação de informação ao mercado – as condições de remuneração dos seus órgãos sociais, não fazendo qualquer sentido que abra uma excepção no presente caso. Até porque, a bem da verdade se deve sempre sublinhar o empenho e profissionalismo com que o auto-ou-nem-por-isso demitido administrador exerceu todas as funções que lhe foram atribuídas no seio do seu remunerador grupo empresarial.

E vêm-me radiosos Sete-Sóis e iluminadas Sete-Luas apontar o dedo à indubitável e inconfundível cova do polvo? Quem, em seu juízo perfeito, é que é capaz de afirmar que o bichinho vive em cova certa? Esse triste e odiado cefalópode que nem tentáculos tem, mas apenas uns míseros oito bracinhos com os quais procura o seu alimento, sabe Deus coitadinho, valendo-se apenas do seu especializado bracito hectocótilo para quando sentir ganas de fecundar alguém. A lula e o choco sim, esses malfadados cefalópodes, não se contentando com os mesmos oito braços, contam ainda com dois pujantes tentáculos com os quais travam verdadeiras guerras espermatófitas, capturam cruelmente as suas presas e fazem delas o que bem lhes apetece.
Já não há pachora para estas proliferantes classes de cephalophodas.

8 comentários:

Mofina disse...

Enaaa, cheguei agora mesmo, tenho de tomar fôlego para comentar.

mac disse...

A PT não é uma empresa pública, Bli. O Estado tem uma golden share mas isso tem muito, mesmo muito, pouco a ver com ser uma empresa pública.

Sobre tudo o resto, plenamente de acordo. O problema é que o resto do mundo parece adorar os bichos.

Blimunda disse...

Mac, caramba pá!:)

Não foi provocação, mas juro que sabia que ias escrever exactamente isso.

Bem sei que o facto de haver uma golden share não significa que seja pública a empresa. O diabo é que o tal administrador ocupava, segundo informam os nossos amigos comunicadores sociais, exctamente, a cadeira da dita cuja, com seu redondinho traseito. Em que números, directos e indirectos, é que esse facto se traduz para o erário público? Pois, não sei!

Privada, o bacoco disse...

Ei Bli, acho ke a escrita está excelente, adorei~. Agora nao entendi bem, foi o fim do personagem povo, nem o papel, mas o escrito está supremo, vou ler outra vez.

jg disse...

Substitua-se "A CLASSE CEPHALOPODA"
por ...ACEPHALOPHODA e encerre-se o processo.

Blimunda disse...

Privada, dizes povo ou polvo? É que se for povo, o papel é sempre o mesmo – fazer-se à parede e fazer de conta que conta para a decoração. Se for polvo, é continuar a esbracejar, ad-eterno.
Jg, acephalophodas são todas elas.

privada disse...

o papel do polvo já entendi, no fim vai deixar um rasto negro

Blimunda disse...

Muita tinta, amigo, muita tinta.